quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Uma fronteira para o grito

Inseguro entre o céu e a estepe, suspenso num fluir de roda gigante, embebido na minha nostalgia de centauros, eu devoro pedaços de musgo e raízes de plátano, estendido em jardins intermináveis onde se modelam arcanjos. Teria sido muito mais fácil escrever cartas de amor, para serem estendidas ao longo das estradas e pelas paredes dos tribunais – são inúteis para a vida, porém, estes poucos instintos que lentamente se devoram uns aos outros – sobra-nos apenas uma memória de fugas de amantes, a grandeza do gesto de um epiléptico, a solidão profunda dos grandes sedutores. Há sonhos, porém, que nos acometem com uma simetria de gaitas de fole - há também a necessidade de escrever testamentos, sempre obscuros, insultando os jardineiros das praças públicas, e aqueles que comem hóstias com uma regularidade de aranha e armazenam pontas de cigarros em cofres de aço, temerosos da posteridade. É absolutamente necessário, também, conclamarmos à união os famintos de santidade, os guardiões de serpentes e domadores de circo, os exploradores dos subterrâneos das pontes e viadutos, os exilados voluntários, para partirmos juntos em busca da inviolável liberdade dos caminhos seguidos ao acaso, e da verdade contida nas escadarias, pórticos e paredões desabados.

publicado em Anotações para um Apocalipse, 1964

[ Claudio Willer ]


Saiba mais sobre Claudio Willer
http://www.jornaldepoesia.jor.br/cw.html#bio

Um breve registro pessoal sobre Claudio Willer

Conheci ele por um acaso da vida. Num dia recebo um e-mail dele com o convite para a posse da UBE - União Brasileira dos Escritores. Eu nessa época trabalhava como editor e respondi para ele dando meus parabéns e minha saudação ao mandato dele como presidente da UBE. Isso foi em 2003.

Depois me dei conta que ele havia sido tradutor de diversos livros que eu simplesmente adorava como o clássico beatnik Uivo do Allan Ginsberg, os Escritos do Antonin Artaud e o belo livro Crônicas da Comuna reunindo vários textos de escritores que viveram durante a Comuna de Paris.

Quando pude conhecê-lo pessoalmente, minha admiração só aumentou. Convidei ele para se associar a luta contra a Guerra no Iraque, subscrevedo o manifesto NÃO EM NOSSO NOME, que ele acabou encabeçado no Brasil.

Convido todos vocês a conhecerem o restante da obra do Claudio Willer.

A.L.

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